Nesta escalada rumo ao topo da montanha, procuro peculiares equilíbrios, entre a força dos dedos que se cravam na rocha e o balanço do corpo que tenta a todo o custo manter-se justo na sua verticalidade. Por vezes parece-me impossível esticar o braço tão longamente, há, quase sempre, um abismo entre o vazio que me separa da base do rochedo e aquele singular momento em que as mãos sujeitam com força hercúlea um corpo pendente da razão de se manter vivo, contra a corrente da gravidade que o empurra. Não olho para trás, seria demasiado perturbador para a alma perceber a distância que a afasta do corpo pendurado no alto da escarpa. Contudo prossigo, enfrentando todo e qualquer perigo, sabendo que nenhum arnês me protegerá da queda abrupta. Quero alcançar o cimo, sentir os músculos cansados serem afagados pelos ventos, só assim serei capaz de ilibar os meus tormentos e sentir que valeu a pena cair tantas vezes, para aprender a trepar, para ser capaz de escalar cada um dos meus obstáculos. Afinal, há uma eternidade para experimentar, e daqui de cima, consigo ver ao longe o paraíso, que é muito mais do que preciso. Agora, basta-me abrir asas e planar, porque sei que depois do corpo purgar, já poderei a alma para lá levar.


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